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DESVENDANDO AS FACETAS DA PRECLUSÃO: APLICAÇÕES E IMPLICAÇÕES NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO

UNVEILING THE FACETS OF PRECLUSION: APPLICATIONS AND IMPLICATIONS IN BRAZILIAN CIVIL PROCEDURE

Aluno: Valmir Jorge Comerlatto[1]

Orientador: Helio Sales Rios

RESUMO

O presente artigo aborda minuciosamente a preclusão no direito processual brasileiro, com foco em fundamentos, tipologias e integração ao Código de Processo Civil de 2015. Originária do latim, a “preclusão” atua como restrição de atos processuais. Com raízes no direito romano, sua importância contemporânea é incontestável. Analisa-se sua natureza multifacetada, categorias temporais e aplicação pelos juízes para garantir a estabilidade procedimental. Aprofunda-se na tutela de urgência do CPC/15, crucial para a efetividade judicial, e nas tutelas provisórias, avanço na eficácia processual. Em síntese, a preclusão é vital para o processo civil, demandando análise reflexiva dos operadores do direito, para aprimorar o sistema judicial e garantir segurança jurídica e celeridade.

Palavras-chave: CPC/15; Direito Processual; Preclusão; Segurança Jurídica;  Tutelas Provisórias.

ABSTRACT

This article thoroughly addresses estoppel in Brazilian procedural law, focusing on foundations, typologies and integration into the 2015 Code of Civil Procedure. Originating from Latin, “preclusion” acts as a restriction on procedural acts. With roots in Roman law, its contemporary importance is undeniable. Its multifaceted nature, temporal categories and application by judges are analyzed to ensure procedural stability. It delves into the urgent protection of CPC/15, crucial for judicial effectiveness, and provisional protection, an advance in procedural efficiency. In summary, estoppel is vital for the civil process, requiring reflective analysis from legal operators, to improve the judicial system and guarantee legal security and speed.

Keywords: CPC/15; Procedural Law; Estoppel; Legal Security; Protect them Provisionally.

1 INTRODUÇÃO

O instituto da preclusão, enraizado no âmago do processo civil brasileiro, emerge como um elemento essencial na estruturação do ordenamento jurídico, preenchendo lacunas significativas no desenvolvimento dos trâmites legais. Inicialmente subestimado pela doutrina, ganhou força no século XX com a análise de Chiovenda, influenciando pensadores jurídicos destacados.

No contexto do direito brasileiro, a preclusão ganhou destaque com a promulgação da Constituição Federal de 1988, consolidando seu status constitucional para agilizar o processo. Agora, regulado pelo Código de Processo Civil de 2015, é tema recorrente em debates jurídicos, visando otimizar sua aplicação e evitar excessos.

Este estudo, pautado em uma metodologia bibliográfica, almeja suprir lacunas na apreensão da preclusão no âmbito do processo civil brasileiro, elucidando-a como um artefato de coarctação e obstrução.

A investigação das suas raízes conceituais e modalidades revela uma polifonia, atingindo metas tanto teóricas quanto práticas. A vastidão do tema impulsiona a necessidade de novas pesquisas, elevando a preclusão ao status de uma constelação intelectual no vasto território do saber jurídico, estimulando uma ininterrupta busca por compreensão mais aprofundada.

Desprovido de qualquer intento de exaurir a matéria, torna-se imperativa a continuidade de estudos para fomentar o diálogo jurídico e promover o progresso da comunidade acadêmica, com vistas à otimização das práticas regimentais e ao enriquecimento do corpus juris.

2 EXPLORANDO OS FUNDAMENTOS JURÍDICOS DA PRECLUSÃO

2.1 Origem

Segundo Giannico (2005, p. 36), a palavra preclusão tem origem latina em preclusio, do verbo precludare, significando exclusão, com o verbo traduzido como impedir.

Toscan (2015, “Prec. Proc. Civil”) explora a etimologia latina de preclusão (praecludere), formada pela fusão do verbo claudere com o prefixo prae, denotando o ato de fechar, obstruir e bloquear. Esse sentido latino do termo, presente em dicionários italianos, é definido por Carlo Parlagreco como fechar, impedir e atravessar (Toscan, 2015, “Prec. Proc. Civil”).

Rocha (2011, p. 17) também vincula a origem da palavra preclusão à expressão latina precludere, significando impedir ou fechar a cara, composta por prae e claudo ere, que em português significa obstruir. Giannico (2005, p. 36) associa a preclusão ao direito romano-canônico, de natureza punitiva. O interesse acadêmico pelo fenômeno intensificou-se no século XX.

Rocha (2011, p. 18) descreve aspectos do fenômeno no direito romano, informando que:

A ordenação do processo por fases se fazia presente. Eram separadas o ius e o iudicium. A primeira fase (ius) versava sobre o cabimento da ação e os limites da controvérsia, e se desenvolvia perante o magistrado de administrar a justiça, com o objetivo de construir o iudicium. O dare action era a admissão; denegare action correspondia à não admissão da ação. A fase in Iuri se encerrava com o litiscontestatio; a fase apud inudicem com a sentença proferia pelo iudex, um cidadão privado.

A evolução do direito romano revela uma variabilidade na sua rigidez ao longo dos tempos, conforme elucidado por Buzaid (1956, apud Rocha, 2011, p. 21). No século XVII, na França, emergiu uma norma análoga à preclusão, designada como forclusion (exclusio a foro), como descrito por Coutere (1958, apud Rocha, 2011, p. 25), a qual englobava aspectos tanto do direito material quanto do direito processual.

É notório, segundo Sica (2005, p. 15), que nos primeiros séculos após as invasões bárbaras, os povos envolvidos mantiveram intacta sua língua, tradições e ordenamento jurídico. Esse contexto da alta Idade Média permite uma análise mais genuína do processo civil dos povos bárbaros, ressaltando a necessidade de compreender sua influência nos sistemas processuais modernos (SICA, 2005, p. 15).

Além disso, Sica (2008, p. 18) enfatiza a relevância de uma abordagem sucinta do processo canônico. Ele observa que, de forma similar ao direito germânico, o processo civil canônico apresenta uma diversidade de terminologias no período clássico (SICA, 2008, p. 18).

É interessante notar, conforme Balbi (1982, apud Sica, 2008, p. 18), que no direito canônico, foi instituído o ardo solennis como método para conferir às decisões uma formalidade superior àquela dos povos germânicos. No entanto, isso não fortaleceu a atividade processual das partes, mas sim permitiu o adiamento de prazos mediante juramento de boa-fé (Balbi, 1983, apud Sica, 2008, p. 18).

2.2 Conceito

Giannico (2011, p. 40) descreve o conceito de preclusão como desafiador, considerando sua definição longa ou incompleta, conforme referido por Barbi (1955, apud Giannico, 2011, p. 40). Rocha (2011, p. 25) destaca a dificuldade devido à variedade de situações abrangidas e à confusão com outros fenômenos, até a uniformização do tratamento.

Alvin (1997, p. 457), citado por Giannico (2011, p. 39), reconhece a preclusão como um verdadeiro princípio processual crucial para o andamento do processo. Seu desenvolvimento moderno é atribuído a Giuseppe Chiovenda (Bülow, 2003, apud Giannico, 2005, p. 37), que identificou os limites necessários para tornar o processo célere e preciso.

Chiovenda (1993, p. 34) estabeleceu os fundamentos da preclusão visando impor limites ao exercício das faculdades processuais. Ferreira Filho (1991, p. 19) destaca a contribuição de Chiovenda para a formulação do conceito.

Apesar das críticas à sua definição inicial, Chiovenda aprimorou seu estudo, resultando em uma definição mais abrangente e clara (CHIOVENDA, 1998, p. 184).

A compreensão do conceito de preclusão é crucial para sua aplicação e funcionalidade no processo (Rocha, 2011, p. 26). O objetivo principal deste estudo é identificar sua relevância na prática jurídica

2.3 Essência jurídica

A essência e o conceito da preclusão têm sido alvo de diversas interpretações, refletindo incertezas na análise desse tema. Giannico (2005, p. 57) destaca as dificuldades na definição da natureza jurídica da preclusão, enquanto Rocha (2011, p. 30) ressalta as controvérsias na conceituação desse instituto processual.

Toscan (2015, “Precl. Proc. Civil”), ao mencionar Riccio, descreve a preclusão como um fato processual que impede a realização de atividades posteriores, resultando na perda de uma faculdade processual. Além disso, Toscan explora os efeitos jurídicos da preclusão, tanto primários quanto secundários. Segundo Toscan (2015, “Precl. Proc. Civil”), Riccio concebe a preclusão como um fato jurídico processual que extingue ou impede uma faculdade processual, regulado pelo direito e produzindo efeitos processuais.

Marques (1958, apud Toscan, 2015, “Precl. Proc. Civil”) identifica diferentes tipos de preclusão, como a temporal, lógica e consumativa, cada uma com características específicas.

Cintra, Grinover e Dinamarco (2002, p. 328) definem a preclusão como um fato impeditivo que impulsiona o avanço do processo, representando a perda de uma faculdade processual. Giannico (2005, p. 76) e Toscan (2015, “Precl. Proc. Civil”) debatem a natureza das preclusões, enfatizando seus efeitos jurídico-processuais.

Essa análise evidencia a complexidade da preclusão, demandando uma compreensão aprofundada por parte dos operadores do Direito para assegurar a efetividade do processo e a segurança jurídica das partes envolvidas.

3 MODALIDADES DE PRECLUSÃO

3.1 Preclusão segundo Chiovenda

Após uma minuciosa análise acerca da origem, do conceito e da natureza jurídica da preclusão, bem como sua aplicação no direito comparado, este capítulo se dedica a examinar as distintas classificações relativas a esse instituto.

Inicia-se uma investigação dos mestres clássicos, desde Chiovenda, venerado como o arquiteto desse instituto, até os autores contemporâneos que enriqueceram o campo do Direito com suas contribuições.

Nesse contexto, salienta-se a consideração de Toscan (2015, “Precl. Proc. Civil”), que alude a Manzini (1952, p. 221), o qual postula que “ao menos teoricamente, todo ordenamento jurídico pode estabelecer o seu próprio sistema preclusivo”.

Segundo Ricio (1951, apud Toscan, 2015, “Precl. Proc. Civil”), “a preclusão pode manifestar-se de forma explícita ou implícita, parcial ou total, absoluta ou relativa”.

Em conclusão, a variedade de enfoques sobre a preclusão, conforme debatido por distintos autores como Stea (1912), Estagnan (2009) e Andrioli (1978), evidencia a complexidade do tema e a necessidade de uma análise meticulosa das modalidades preclusivas, considerando o contexto jurídico nacional e as perspectivas de estudo adotadas.

3.2 A preclusão temporal

O conceito de preclusão temporal, segundo Toscan, Chiovenda e Rocha, está vinculado à não realização de um ato processual dentro do tempo previsto.

Os prazos são fundamentais para disciplinar o curso do processo, evitando litígios intermináveis. A preclusão ocorre quando há descumprimento desses prazos, especialmente os próprios.

Aos prazos impróprios, as consequências são de ordem disciplinar, pois não afetam diretamente o andamento do processo. O juiz e outras partes envolvidas estão sujeitos a esses prazos, cumprindo deveres processuais.

A preclusão temporal é expressamente regulada no CPC/73 e CPC/2015, aplicando-se quando os atos processuais são realizados fora do prazo estipulado pela norma.

Rocha (2008, p. 256) observa que no Brasil:

Soba égide do  Código de Processo Civil de 1973, os prazos peremptórios não admitem prorrogação mediante convenção entre as partes (art.182), a qual, todavia, é permitida em relação aos dilatórios (art. 181); sob o regramento do  Código de Processo Civil de 2015, por sua vez, tanto os peremptórios como os dilatórios podem ser alterados (dilatados ou reduzidos), nos termos de seus arts. 191 e 222.De todo modo, são preclusivos, em ambos os sistemas, tanto os prazos peremptórios, como os dilatórios.

Afinal, “uma coisa é a natureza do prazo em si (peremptório ou dilatório), outra é a consequência prevista em lei para seu transcurso in albis (preclusão)” (Sica, 2008, p. 131-132).

Destaca Estagnan (2009 apud Toscan, 2015, “Precl. Proc. Civil”), que:

A preclusão temporal não está reduzida à ideia de superação de cada um dos termos previstos para a prática dos atos processuais, tampouco pode ser redirecionada exclusivamente ao fechamento das fases que compõem o procedimento, sob o risco de restar limitada à ideia cronológica de tempo como objeto de medida, desprezando-se sua afinidade com a perspectiva de tempo como momento adequado, inegavelmente relevante para a adequada compreensão da problemática.

Rocha (“Precl. Proc. Civil”, 2015), analisa que:

A relação entre o tempo e os atos processuais integrantes do procedimento, assim como entre o processo e a realidade que lhe é subjacente, para que se possa compreender o verdadeiro alcance da preclusão temporal, enquanto fenômeno resultante da inobservância do momento apropriado para o exercício dos direitos processuais, muito mais que do simples extrapolar de prazos legais ou fases processuais.

No âmbito jurídico, a compreensão dos prazos preclusivos revela a perda de prerrogativas diante de sua transgressão, conforme abalizou Sica (2008, p. 132).

Os prazos peremptórios, indiscutivelmente vinculativos por mútuo consentimento, impõem a execução sob pena de preclusão, ao passo que os dilatórios, passíveis de dilatação, não se sujeitam a tal consequência.

Cabral (2021, p. 151) sumariza que a preclusão temporal implica na desvantagem processual advinda da negligência na realização de atos dentro do termo legal, intimamente conectada aos prazos peremptórios que impulsionam o procedimento (Sica, 2008, p. 128).

No CPC/73 era determinado que o réu apresentasse contestação e reconvenção de forma simultânea (Artigos 299 e 315), enquanto o CPC/15 preconiza que a reconvenção seja deduzida na própria peça contestatória, unificando-as (Artigo 343).

É relevante destacar que a preclusão temporal emerge quando se omite o cumprimento dos prazos para apresentação de quesitos e nomeação de perito, bem como quando não se questiona o valor da avaliação durante a fase de cumprimento de sentença.

O estrito respeito aos prazos processuais é de suma importância, pois sua inobservância acarreta sérias consequências para as partes envolvidas, podendo prejudicar seus direitos e interesses.

3.3 A preclusão lógica

A preclusão lógica, conceituada por Cabral (2021, p. 152), configura-se pela prática de um ato processual incongruente com uma conduta anterior, gerando discrepância entre comportamentos. Segundo Toscan (2015, “Precl. Proc. Civil”), ocorre quando há a impossibilidade de exercer um direito conflitante com uma conduta anterior, resultando na preclusão tanto para o ato em análise quanto para outros atos incompatíveis.

A sua finalidade reside em evitar condutas díspares, conferindo vantagens a outros sujeitos ao evitar que o ato produza efeitos. Destaca-se ainda que os atos processuais devem pautar-se pela responsabilidade, visando à coerência no desdobramento do processo (Cabral, 2021, p. 153).

Rocha (2011, p. 82) sublinha que a supressão da preclusão lógica fundamenta-se na percepção de que a contradição, incoerência e instabilidade prejudicam a fluidez e a rapidez de um processo ordenado.

A preclusão lógica transcende as hipóteses taxativas estipuladas no ordenamento, demandando a adesão à coerência nas condutas processuais, em conformidade com os deveres de lealdade e boa-fé processual (Toscan, “Precl. Proc. Civil”, 2015).

Em resumo, a preclusão lógica preserva a ordem, a coerência e a eficiência do sistema jurídico, fortalecendo a segurança jurídica e prevenindo abusos processuais. Ademais, ela serve como instrumento de promoção da boa-fé processual e garante a efetividade e legitimidade do sistema judicial (Sica, 2009, p. 152; Rocha, 2011, p. 82).

3.4 A preclusão consumativa

Rocha (2011, p. 83) apresenta a terceira modalidade de preclusão, denominada consumativa, conforme sistematizada por Chiovenda (1998, p. 184).

Cabral (2021, p. 151) expande a discussão sobre essa categorização, enfatizando a perda da faculdade decorrente da realização prévia do ato. Toscan (2015, “Precl. Proc. Civil”) esclarece que a preclusão consumativa ocorre quando o ato processual sujeito à preclusão já foi executado, impossibilitando sua repetição, em conformidade com o princípio do ne bis in idem.

Cabral (2021, p. 152) e Comoglio (1978, p. 190-193) baseiam essa modalidade nos princípios romanos e na busca contemporânea pela eficiência processual. Rocha (2011, p. 84) enfatiza que a preclusão lógica é consumativa, evitando a repetição do ato e de outras possibilidades, demonstrando a responsabilidade dos litigantes.

Em suma, a diligência e a ética são essenciais para a eficácia e a rapidez do processo, garantindo os direitos das partes e fomentando uma sociedade mais justa e equitativa (Toscan, Comoglio, 2015; Rocha, 2011).

3.5 A Preclusão e o Juiz: Entenda Como a Lei Influencia suas Decisões

Rocha (2008, p. 84) ilustra a submissão do juiz à preclusão, uma concepção presente na obra de Chiovenda.

A teoria de Chiovenda, recebida no Brasil com ressalvas justificadas, provocou um debate sobre a validade da proibição do juiz em revisitar questões já decididas, contradizer-se ou contrariar-se, conforme estipulado nos Códigos de Processo Civil de 1973 e 2015.

Ambas as legislações, no artigo 471 do CPC/73 e no artigo 505 do CPC/15, estabelecem claramente a preclusão dos poderes do juiz. É imperativo que o juiz não reanalise questões previamente decididas na mesma lide, salvo em situações excepcionais.

A menção genérica a questões nos dispositivos legais é suficiente para que grande parte da doutrina reconheça a explícita regulação da preclusão para o juiz no ordenamento jurídico brasileiro (Rocha, 2008, p. 84).

Conforme Pontes de Miranda (1997, p. 146-147), o art. 471 do CPC/73 trata tanto da coisa julgada formal quanto da preclusão, estipulando a imutabilidade das decisões judiciais no mesmo processo, com exceções previstas nos incisos.

Porto (2000, apud Rocha, 2011, p. 85) destaca que todas as questões da lide estão sujeitas à preclusão. Dessa forma, qualquer matéria discutida durante o processo, resultando em decisão interlocutória, torna-se imutável, vedando nova decisão.

Rocha (2011, p. 85), pondera que:

Com base na própria localização dos dispositivos nos  Códigos, no entanto, não são poucos os que defendem exatamente o contrário, preconizando que o alvo do legislador, ao vedar novo julgamento, era apenas a coisa julgada material, rejeitando, assim, a ideia de que a preclusão para o juiz esteja consagrada no ordenamento processual pátrio, ao menos expressamente.

O pensamento de Cintra enfatiza que as questões concernentes à lide são intrinsecamente questões de mérito, cabendo exclusivamente ao juiz decidir sobre elas em sentença.

É fundamental reconhecer, em consonância com a maioria da doutrina, que o referido artigo do CPC/73 apenas explicita a consequência prática da coisa julgada material, que consiste na impossibilidade de o juiz reconsiderar pedidos já decididos relativos a uma determinada lide.

Cruz e Tucci (1989) elucidam a origem histórica desse dispositivo, destacando sua semelhança com o Projeto Mortara italiano, que proibia o juiz de reconsiderar questões já julgadas em sentença, desde que referentes à mesma disputa. Cabe destacar, que naquele sistema, no bojo do mesmo feito, o juiz proferia sentença em cada fase do processo.

Segundo esses estudiosos, essa proibição visa evitar o reexame de questões relacionadas ao mérito da causa, impedindo que temas já decididos sejam rediscutidos, independentemente de terem sido decididos pelo juiz ou não.

Rocha enfatiza que a interpretação do artigo 471 do CPC/73, similar ao artigo 505 do CPC/15, não é determinante para o reconhecimento da preclusão pelo juiz, representando, em certo ponto, uma discussão estéril. Esta análise ressalta a complexidade e a amplitude da matéria processual.

Lopes (1984 apud Rocha, 2011, p. 86) defende que a proibição de o juiz decidir novamente as questões já decididas independe de regra legal expressa, pois o princípio do ne bis in idem deve ser compreendido como inerente ao sistema, sob pena de instaurar-se regime de insegurança e intranquilidade para as partes e desprestígio para a função jurisdicional. Esse posicionamento destaca a importância da estabilidade e da confiabilidade do sistema jurídico.

A aplicação do artigo 505 do CPC/15 não se limita à sua interpretação literal. Pelo contrário, é fundamental reconhecer que a preclusão vincula o órgão julgador. Esse entendimento é cada vez mais aceito na comunidade jurídica, conforme destacado por Rocha (2011, p. 87). Este ponto ressalta a evolução e a consolidação dos princípios processuais.

Com efeito, evitar abordar a aplicação da preclusão ao juiz é inaceitável. Reconhecer essa aplicação é fundamental para assegurar a estabilidade e a segurança jurídica no processo.

Portanto, a preclusão deve ser aplicada também às decisões intermediárias (interlocutórias), sob pena de tumultuar o processo e comprometer o tratamento igualitário das partes, como ressaltado por Theodoro Junior (2001, apud Rocha, 2011, p. 87). Essa perspectiva destaca a importância da uniformidade e da imparcialidade no processo judicial.

4 EXPLORANDO AS NUANCES DA PRELCUSÃO NO CPC/15

O Código de Processo Civil de 2015 (CPC/15), assim como seu predecessor, o CPC/73, disciplinou minuciosamente o instituto da preclusão por meio de diversos dispositivos, os quais serão examinados adiante. A preclusão encontra-se delineada em múltiplos dispositivos do CPC/15.

De acordo com o comentário de Conceição (2019), a preclusão consumativa, delineada no artigo 494, ressalta que a sentença é irrevogável no sistema jurídico brasileiro. Uma vez publicada, ocorre a preclusão consumativa para o juiz, vedando-o de modificar a decisão, salvo em situações expressamente previstas em lei, como, por exemplo, “para corrigir-lhe, de ofício ou a requerimento da parte, inexatidões materiais ou erros de cálculo”, consoante previsão do artigo 494, inciso I.

É relevante observar que o termo “publicada a sentença” no referido artigo não se refere à publicação como intimação pelo órgão oficial de imprensa, mas sim ao momento em que se torna acessível ao público. A partir desse momento, qualquer alteração se torna vedada.

Além das disposições contidas no artigo 494, I, o CPC/15 estabelece outras exceções. Por exemplo, o artigo 331 possibilita que o juiz, em sede de apelação contra decisão que indefere a petição inicial, se retrate. O artigo 485, § 7º, permite ao magistrado reanalisar decisões que extinguem o feito sem resolução de mérito.

Da mesma forma, o artigo 332, § 3º, faculta ao julgador retratar-se de decisões que julgam improcedente o pedido inicial antes da citação do réu. Por fim, o artigo 1.040, inciso II, autoriza a retratação da turma do tribunal intermediário com base em acórdão paradigma, sob o rito dos recursos repetitivos.

Vale dizer, que a preclusão consumativa para o juiz é regida principalmente pelo artigo 494, mas também encontra expressão no artigo 505. Segundo Talamini (2019), o caput desse artigo consagra a norma da preclusão consumativa do poder decisório do juiz, destacando que esta se distingue da coisa julgada por não repercutir diretamente fora do processo. Em regra, o juiz perde o poder de decidir novamente, no curso do processo, a questão que já decidiu.

Ao abordar as questões processuais de ordem pública relacionadas aos poderes do juiz, Talamini (2019) destaca que os pressupostos processuais e as condições da ação, sobre os quais o juiz pode deliberar ex officio, podem ser reexaminados, seja por iniciativa do próprio juiz ou por solicitação da parte interessada. Entretanto, essa revisão só é possível se a decisão anterior não tiver encerrado o processo ou sua fase cognitiva, caso em que se aplica o artigo 494 do CPC/15.

A Súmula 424 do Supremo Tribunal Federal (STF) estabelece que o despacho saneador, quando não houver recurso, exclui as questões deixadas para a sentença, seja de forma explícita ou implícita. Assim, a Súmula nº 424 do STF não se aplica a essas questões de ordem pública.

No que diz respeito às decisões interlocutórias de mérito e de ordem pública e à preclusão para o julgador, Talamini (2019) afirma que as decisões interlocutórias sobre parte do mérito, quando não sujeitas a recurso ou reexame obrigatório, tornam-se definitivas. Mesmo que durante a instrução probatória de uma parte ainda não julgada do mérito o juiz se deparar com uma questão de ordem pública que afetaria também a parte já decidida, ele não poderá modificar a decisão anterior. Nesse caso, também se aplica o art. 494 do CPC/15.

Por fim, os artigos 507 e 1.000 impedem que as partes discutam novamente questões já preclusas no âmbito do processo. Talamini (2019) explica que a preclusão consiste na perda de uma faculdade ou poder processual no curso do processo, podendo ser ocasionada pelo decurso do prazo, pelo anterior exercício do poder ou faculdade, ou pela prática de ato logicamente incompatível com o exercício do poder ou faculdade.

As partes podem se sujeitar às três formas de preclusão: temporal, consumativa e lógica. Já os poderes do juiz geralmente estão sujeitos apenas à preclusão consumativa. Em relação à exceção à preclusão das partes, em situações em que o juiz pode reconsiderar a questão durante o processo, a regra do artigo 507 não se aplica. Nessas circunstâncias, as partes têm permissão para pleitear ao juiz essa reconsideração.

Sinteticamente, o CPC/15 ratificou e regulamentou as formas de preclusão temporal, consumativa e lógica, além de incluir de maneira explícita, no artigo 505, a preclusão consumativa para os poderes do juiz.

Essas disposições legais fundamentais visam promover a eficiência e a segurança jurídica no âmbito processual, garantindo a regularidade e a fluidez dos procedimentos. A preclusão, enquanto instituto processual, desempenha um papel crucial na estabilização das decisões judiciais e na preservação da ordem processual.

5 CONCLUSÃO

Ao findar a presente exposição, é digno de nota que não se teve a pretensão de exaurir o tema, cuja relevância é indiscutível.

Explorando os diversos prismas da preclusão, desde sua gênese latina até sua atual complexidade, desvela-se sua natureza polifacetada. A aplicação judiciária da preclusão objetiva preservar a estabilidade e a ordem processual, restringindo revisões supérfluas.

Consequentemente, a preclusão figura como um esteio fundamental para a efetividade do processo e a salvaguarda da segurança jurídica. Sua pertinência no contexto processual contemporâneo demanda uma abordagem pragmática e reflexiva, salientando a contínua necessidade de estudo e análise por parte dos juristas e acadêmicos.

O Código de Processo Civil de 2015, por sua vez, promoveu avanços notáveis em relação à preclusão, estabelecendo diretrizes claras e refletindo um compromisso genuíno com os princípios constitucionais e os ideais de um Estado Democrático de Direito.

Portanto, corrobora-se que a preclusão se erige como um pilar essencial para a eficácia do processo e a preservação da segurança jurídica.

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WAMBIER, Teresa Arruda Alvin. Nulidades do processo e da sentença. 4. ed. São Paulo: Ed. RT, 1998.


[1] Valmir Jorge Comerlatto é um jurista ítalo-brasileiro, autor de diversas obras literárias e artigos jurídicos, e advogado desde 2008.

Formação Acadêmica: Oficial da Polícia Militar do Paraná, formado pela APMG (1994); Licenciatura em Letras/Anglo pela UNESPAR (2001); Bacharel em Direito pela UNICURITIBA (2007); Pós-Graduação Latu Sensu em Língua Portuguesa e Literatura pela UNESPAR (2002); Pós-Graduação Latu Sensu em Direito Público pela UNIBRASIL (2008); Escola da Magistratura Federal do Paraná (ESMAFE) (2010); Pós-Graduação Latu Sensu em Execução Civil, Audiência Judicial, Regularização de Imóveis e Defesa do Executado pela Faculdade FacCiência (2023); Pós-Graduação Latu Sensu em Direito Militar e Direito Penal Militar pela Unyleya (2024); Mestre em Direito pela Universidad Europea Del Atlántico (2024); Doutorando em Direito pela Instituição Integralize (concluído, aguardando emissão do diploma); Pós-doutorando pela Instituição Minha Bolsa (concluído, aguardando emissão do diploma).

Para mais informações, consulte seu currículo Lattes: https://lattes.cnpq.br/6874122351961683

E-mail: valmir@comerlatto.adv.br

Por Dr. Valmir Jorge Comerlatto

Advogado, com Graduação em Direito pela UNICURITIBA (2007), Especialização em Direito Público pela UNIBRASIL (2008), fez a Escola da Magistratura Federal do Paraná (2010); é Graduado, ainda, no Curso de Formação de Oficiais pela APMG (1994), em Letras pela FAFIPAR (2000); e fez Especialização em Língua Portuguesa e Literatura pela FAFIPAR (2001).
e-mail: valmir@comerlatto.adv.br whatsapp: 41 9 9793-3000

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